Creuza Maria de Oliveira, 65 anos, escreveu seu nome no livro do ineditismo
Com uma trajetória de resistência e conquista na pauta do trabalho doméstico, a baiana Creuza Maria de Oliveira, 65 anos, escreveu o seu nome no livro do ineditismo ao se tornar a primeira trabalhadora doméstica do Brasil a receber o título de doutora honoris causa. Sem ter completado o ensino médio, o caminho que a levou até esse momento foi forjado com a conquista de direitos.
Em 1992, Creuza ajudou a fundar e foi a primeira presidente do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos da Bahia; foi uma das idealizadoras do Conjunto Habitacional 27 de abril, em Salvador, exclusivamente para as trabalhadoras domésticas baianas, inaugurado em 2012; e batalhou pela conquista da Pec das Domésticas, aprovada em 2013.
A trajetória da sindicalista no trabalho doméstico começou quando ela tinha 9 anos. Embora tenha nascido na capital baiana, como irmã de oito filhos, morava no município de Santo Amaro, e foi registrada lá, aos 15 anos, com o intuito de se matricular em uma escola de Salvador. O retorno à capital baiana aconteceu após a perda do pai dela, aos 5 anos, e da mãe, aos 12.
Em Salvador, Creuza continuou no trabalho doméstico e, aos poucos, engajou-se na luta pelos direitos da categoria, integrando-se a um grupo de pessoas que se reuniam para discutir os direitos dos trabalhadores domésticos, duas vezes por mês. Os termos “empregada doméstica” e “casas de família” eram constantemente questionados pela ativista.
Para ajudar a fundar o Sindicato dos Trabalhadores Domésticos da Bahia, em 1992, Creuza precisou ajudar a fundar, primeiro, a Associação das Empregadas Domésticas da Bahia. Na época, foi criada a associação porque a categoria ainda não era reconhecida. Portanto, não poderia ter um sindicato.
“A Constituição de 88 foi um momento muito importante, porque antes nós não tínhamos salários, direito à folga, nem aos domingos, porque a lei não deixava claro. Além disso, eu estava começando na luta sindical”, afirma Creuza, que é ativista há cerca de 40 anos.
Hoje, já aposentada e sem filhos, Creuza é presidenta de honra da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad); secretária de Formação Sindical e de Estudos do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos da Bahia (SINDOMÉSTICO/BA); e coordenadora-geral do Instituto 27 de Abril (IEC).
Doutora Honoris
Creuza recebeu o título da Universidade Federal da Bahia (UFBA) durante uma cerimônia realizada no Salão Nobre da Reitoria da UFBA, na última sexta-feira (24). O título foi outorgado por volta das 19h30, pelo reitor da UFBA, Paulo Miguez. Aplausos tomaram conta do ambiente, somado a cânticos e suspiros de admiração. Nessa hora, o Salão Nobre já estava lotado e Creuza não conseguiu conter a emoção.
Com outros títulos na estante, Creuza descreve o de doutora honoris causa como especial pelo reconhecimento vindo da academia. “É essencial que a academia reconheça a luta das trabalhadoras domésticas no Brasil e no mundo, especialmente no Brasil, que a luta começou na década de 30 e ainda nos resta muito a enfrentar”, afirma Creuza.
Premiação
Creuza recebeu, recentemente, o título de comendadora da Ordem Dois de Julho – Libertadores da Bahia. Além disso, a sindicalista recebeu o Prêmio Revista Cláudia, “Mulheres que fazem a diferença”, em 2003; o Prêmio Direitos Humanos, da Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal, em 2003 e em 2011, pela luta contra o trabalho infantil e por igualdade racial; e em 2005 recebeu a Ordem do Mérito do Trabalho no Grau de Cavaleira, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Foi indicada para o Prêmio 1.000 Mulheres para o Nobel da Paz em 2005; recebeu ainda o Troféu Raça Negra da Faculdade Zumbi dos Palmares, em São Paulo, no ano de 2013; e a homenagem “Mulheres Guerreiras”, da Previdência Social. No Senado Federal, recebeu o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz, em 2015, dentre outras diversas honrarias.
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